DA FLEXIBILIZAÇÃO DO SISTEMA PROCESSUAL
CIVIL NA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
Os
sucessivos movimentos políticos sociais do Brasil nos últimos anos, com a
universalização das informações e notável expansão dos meios de comunicação de
massa, são fatores que contribuíram para despertar a população adormecida, para
os valores cívicos da nação.
Quando se
dá a mudança de rumos políticos, a ordem jurídica tende a mostrar-se
imprestável e por consequência a reforma das instituições processuais faz-se
urgente e necessária.
Por
muitos anos o Brasil esteve submetido a um regime autoritário e ditador,
permitindo, o enorme descompasso entre a ordem constitucional e o sistema
processual civil como um todo.
O
direito, como é sabido, é uma ciência normativa e social, refletindo
diretamente na vida em
sociedade. Por isso é de vital importância a técnica
processual, pois é ela quem define o modo pelo qual o processo e seus
resultados repercutem no cotidiano da população.
Nesta
perspectiva, o procedimento não precisa ser tão cartesiano quanto pinta a lei!
A necessária racionalidade jurídica não se apresenta como assepsia lógica,
tendo, pois, o direito brasileiro plenas condições, de apresentar soluções
procedimentais mais adequadas do que os modelos rituais rigidamente previstos
em lei.
Enfim, a flexibilização do sistema processual não é incompatível
com a previsibilidade, segurança e devido processo legal, conforme será
apontado nas linhas a seguir.
A
rigidez legal escraviza o sistema processual civil brasileiro, já que a
adequada tutela dos direitos atenta aos valores constitucionais, depende,
muitas vezes, de uma liberdade procedimental que não é conferida pelo nosso
sistema aos operadores do direito.
O
coroamento de toda atividade desenvolvida com vistas a certos objetivos bem
definidos e até mesmo individualizada em função deles há de ser representado,
naturalmente, pela plena realização dos objetivos eleitos.
A
figura do Estado, como agregador da
sociedade e regulador das relações delas advindas, imputando normas e impondo
seu respeito a elas, sob pena de sanção, é uma concepção moderna e ideal de
gestão.
Em
linhas preliminares, a noção de jurisdição está ligada à idéia de aplicação da norma jurídica abstrata ao fato jurídico concreto, como um
sistema lógico e matemático, no qual o Estado substituiria a "vontade das
partes", fazendo agir o Direito. Seu objetivo não é apenas o castigo, como
também, a paz e a justiça social.
Ocorre
que nos últimos anos a difusão das informações é cada vez maior. O grande
aumento da massa populacional com acesso a informações, verificados
principalmente a partir da redemocratização, seja através do rádio, da
televisão ou da internet modificou as relações sociais e possibilitou que as
pessoas cada vez mais tenham conhecimento acerca de seus direitos.
Neste
contexto, intensas transformações foram verificadas, com os homens partilhando
problemas mais intensamente comuns, especialmente nas grandes cidades, o
consumo exacerbado, fruto da urbanização e das modernas técnicas de comunicação
favorecendo a eficiência do marketing, e mais a complexidade dos problemas
contemporâneos que os sociólogos vêm pondo em destaque são os fatores
responsáveis, nesta nossa era, por “uma descontinuidade acentuada com a que
precedeu”; e
a observação fenomenológica dos novos fatos, relações, necessidades e angústias
do tempo presente que assim acaba por chegar a graus mais sensíveis, a “tensão
entre a norma e a realidade”.
Essas
são evidências empíricas da Sociedade da Informação que revela reflexões constantes,
bem como adaptações ao Direito Positivo.
Se outrora a busca desenfreada era
pelo acesso ao judiciário, hoje, em pleno século XXI, o que se busca é a
prestação da justiça adequadamente, de maneira célere, rápida e eficaz, vez que
o Poder Judiciário
não é suficientemente rápido para acompanhar as mudanças estruturais da própria sociedade, seus novos anseios e aspirações.
A
Constituição de 1988, sem dúvida foi a grande propulsora desse novo modo de
encarar a justiça, com a previsão dos direitos e garantias constitucionais de
acesso a justiça, gratuidade daqueles desprovidos de meios de pagar as despesas
processuais, com a criação e efetivação das Defensorias Públicas, e
principalmente com o fortalecimento do Ministério Público zelando pelos
direitos difusos e coletivos. Mas não é só. A isso some-se o processo de
mundialização da economia, das telecomunicações e dos processos sociais com o
acesso cada vez maior a rede mundial de computadores e a evolução da
conectividade internacional.
Além
disso, o aumento do número de ações decorrentes dos novos direitos da terceira
e quarta gerações; legislação minuciosa e protecionista de cunho individualista
ultrapassada; utilização de recursos meramente procrastinatórios; reduzido
número de juízes; falta de: fiscalização no cumprimento do dever funcional dos
magistrados, qualificação dos operadores do direito e incentivo à solução
extrajudicial dos conflitos, além de outros que têm contribuído para aumentar o
problema da morosidade na entrega da prestação jurisdicional.
Essa
dinâmica provoca reflexões constantes, assim como a necessidade de adaptações e
atualizações metodológicas dos pesquisadores da realidade jurídica que
concebem-na como fenômeno social.
O
processo passa a ser considerado um instrumento para pacificação social,
atingindo escopos políticos, educacionais, preocupando-se até mesmo com o
social e a solidariedade.
Todo
esse desenvolvimento social obrigou o legislador ordinário a pensar e em
realizar modificações legislativas, no intuito de adaptar a legislação á nova
realidade, tanto que na última década foram editadas inúmeras leis, visando o
acesso á justiça, e a celeridade processual.
Como
se sabe, o processo deve ser capaz de produzir resultados efetivos na vida das
pessoas (efetividade da tutela jurisdicional), como também de fazê-lo logo
(tempestividade) e mediante soluções aceitáveis segundo o direito posto e a
consciência comum da nação (Justiça).
Justiça
célere e eficaz é um ideal buscado, inclusive na tentativa de recobrar o
prestígio do judiciário.
A
prestação jurisdicional reclama não somente a entrega de uma sentença de
mérito, e a possibilidade de efetivá-la, mas também a satisfação do direito em
um tempo cada vez menor, superando as desigualdades sociais e instaurando um
regime democrático que efetivamente realize justiça social.
A
reforma do Poder Judiciário tratada pela Emenda Constitucional n.º 45,
promulgada pelo Congresso Nacional em 08.12.2004 tem reflexos diretos no Código
de Processo Civil, e já é uma amostra da finalidade precípua de combater a
morosidade na entrega da prestação jurisdicional, razão pela qual, incluiu
entre os direitos e garantias fundamentais do cidadão (art. 5º, inciso LXXVIII,
CF), "(...) a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação", além de proibir a
promoção do juiz que descumprir os prazos processuais.
A celeridade
processual, frise-se desde já, deve ser observada em conjunto com a garantia do
contraditório, da ampla defesa (art. 5º, LV) do devido processo legal (art.5º,
LIV), além da inafastabilidade da jurisdição (art.5º, XXXV).
Mas não é só, o estudo da tal Emenda
não pode vir desacompanhada da análise e dos desdobramentos das outras reformas
operadas no Direito Processual Civil como um todo, pois o importante é que a
justiça melhore com o escopo de atender bem os destinatários da jurisdição.
Nesse panorama, um dado importante é o
declínio do normativismo legalista, assumido pelo positivismo jurídico, e a
imposição predominante, na aplicação do direito, dos princípios, conceitos
jurídicos indeterminados e juízos de equidade, com toda sua inteireza, porque
correspondem a uma tomada de decisão não mais baseada em um prius anterior ao processo, mas
dependente dos próprios elementos que nele são colhidos.
È assim
portanto, que surgem as tendências flexibilizadoras na Sociedade da Informação,
em um Estado social contemporâneo, com o juiz se libertando de esquemas
processuais pré-moldados para, conforme o caso, encontrar e adaptar as técnicas
processuais adequadas aos diferentes perfis do direito material.
DINAMARCO, C. R. A reforma da reforma. 4.ed. São Paulo:
Malheiros, 2003, p.29.